sábado, 3 de junho de 2006

Projeto

Fortaleza, julho de 2005

Apresentação

O projeto Ciclo Vida já não é mais um recém-nascido. Na verdade, ele é um adolescente, pois com os mesmos objetivos que se seguem nós já realizamos alguns vôos rasantes de bicicleta pelas estradas das áridas terras de Fortaleza à região do Sertão Central do Estado do Ceará e de Fortaleza ao Estado do Rio Grande do Norte. Além dos não raros trajetos de 50 e 80 quilômetros que distam, respectivamente, o Assentamento 24 de Abril – Acarape e o Assentamento Mandu Ladino/ Barra do Leme – Pentecoste de Fortaleza. As pessoas que se dispõe a implementar o Projeto já estão, portanto, em plena forma psicofísica e, sobretudo, política. No entanto, não podemos dizer o mesmo dos meios de transportes que escolhemos para realizar esta tarefa: as bicicletas.

Escolhemos bicicletas pelo menor custo econômico da viagem e pelo fator ecológico, já que elas são bem mais ecológicas do que os carros e bem mais velozes do que os pés. É por isso que, desde já, agradecemos a entidade apelada (a qual acreditamos que estará sensibilizada com esta causa que, felizmente, não é única nossa).

Justificativa

Da semente brota a vida, a qual passa a existir em ciclo, e no ciclo está a existência dos seres. Os vivos nascem, crescem, reproduzem e morrem. Este movimento é tão antigo quanto a vida. Nos primórdios, os ciclos eram maiores, pois a terra era potente antes de sofrer as ações destrutivas das sociedades humanas. Tal referência aos primórdios só confirmam a elástica longevidade dos seres antigos, como por exemplo, os dinossauros. Há referências feitas pela Bíblia à longevidade dos homens no Antigo Testamento e até os indígenas da tribo Janduí, da Nação Canindé, viviam até 200 anos, segundo Olavo de Medeiros (historiador do Rio Grande do Norte).

O ser humano não soube se beneficiar do presente (ou conquista) que a Natureza lhe deu – a racionalidade – e terminou tornando suas ações altamente irracionais. Isto implicou em drásticas conseqüências para si e para os demais seres, sobre os quais se estabeleceu uma ditadura considerando-se a supremacia da civilização e submetendo tudo e todos aos caprichos e necessidades consumistas. Tudo isto para atender a fome de lucros em um sistema mercantilista, concentrando para si o poder de destruir ou poupar o futuro da vida, inclusive a sua própria.

Não temos a ilusão de que as soluções venham de uma deliberação humana uníssona, mas sim que seja resultado de um processo decorrido de embates com interesses antagônicos nesta sociedade, nos quais estariam concorrendo os que querem uma sociedade justa e ecologicamente equilibrada contra os que só enxergam lucros acima da vida (mesmo que seja a sua e a da sua posteridade).

Infelizmente, mesmo assistindo ao esgotamento dos elementos naturais (sem os quais não se vive), o lucro é o maior anseio da maioria esmagadora hoje. As fontes de lucro estão cada vez menores e, ao invés de rever os equívocos e recuar em benefício da vida, acelera-se cada vez mais a corrida desenvolvimentista, revolucionando e sofisticando-se as indústrias da morte, as quais são impiedosamente alimentadas de vida. A avidez de lucro parece insaciável e o avanço diminui drasticamente as perspectivas vitais dos seres – animados ou inanimados – tornando-lhes obsoletos em plenas condições de exercer funções.

A revolução da microeletrônica produz aparelhos cada vez menores e mais poderosos, eficazes no sentido de convencer as pessoas da sua necessidade básica. O mercado é como um ferro de passar roupas: tem de estar sempre aquecido, cuja energia é o modismo difundido pelos meios de comunicação em massa, a qual está estampada no cotidiano de cada família, onde cada qual vale pelo que consome e mais valor tem quem está na moda.

As revoluções cor de cinza da indústria fumacenta provocando crises econômicas e ecológicas tiveram que arrastar nos seus reboques as (revoluções) convulsões sociais, provocadas pelo abismo entre as classes entre os que produzem e os que se apropriam. A grande quantidade de indivíduos fora do processo produtivo e do mercado de trabalho vivendo na informalidade contrastando com o rigor burocrático.

Até hoje a burguesia continua sendo a mesma, desde os burgos de Londres, Manchester ou Paris. Esta burguesia surge com o fim do feudalismo e, por incrível que pareça, tudo muda de figura quando suas revoluções descem para a realidade rural. Como na Revolução Verde, a qual consistiu na vontade burguesa de apropriação da liberdade de reprodução dos seres vivos, tornando-a fonte de lucro, expropriando a liberdade dos artesãos da terra (os agricultores) de plantar e colher o que quiserem e quando quiserem.

Os transgênicos já são uma realidade aterrorizante e estamos prestes a sermos solapados por esta epidemia. Portanto, achamos que é necessário intensificar uma campanha por terra, já que os movimentos neste sentido ainda são aéreos e/ou nas salas da academia universitária. Estamos certos de que devemos valorizar o que já existe em progresso quanto a isso e queremos nos somar às experiências agroecológicas existentes pelo mundo afora. Gostaríamos de trazer os que estão no alto para o chão, exatamente onde se encontram os perigos dos transgênicos.

É, então, pelo chão que pretendemos ir, utilizando bicicletas para facilitar nossa locomoção pelos campos brasileiros, levando sementes naturais e fazendo trocas para levar adiante a outras comunidades e/ou indivíduos.

Não somos os donos da verdade e não pretendemos levar lições em tons professorais, queremos levar, na verdade, a preocupação para ser partilhada com os demais que trabalham na terra assim como nós, no sertão cearense. A preocupação é a do desaparecimento das sementes originai, as quais estão em sua maioria extintas. Nossa pretensão é a de fazer um levantamento das variedades ainda existentes, incentivar a conservação destas e a distribuição para o maior número de pessoas, fazendo com que se garanta a regeneração do patrimônio natural ameaçado e, por conseguinte, toda a biodiversidade que depende deste patrimônio.

Objetivos

Objetivos gerais:

1. Partilhar com as demais pessoas, no campo e na cidade, as preocupações sobre a Reforma Agrária e o meio-ambiente, no intuito de incentivar uma campanha por uma nova relação com a terra; pela preservação das sementes originais (crioulas) e contra os organismos geneticamente modificados (OGM’s).

2. Através das bicicletas, questionar na prática nossa dependência do motor e do dinheiro e tentando nos libertar da escravidão em que nos encontramos de forma ecológica e autônoma.

Objetivos específicos:

a)Trocar sementes entre comunidades e indivíduos;
b)Fazer levantamento e distribuir a maior quantidade de variedades possíveis de sementes;
c)Participar e contribuir para a realização de estudos, palestras e debates sobre os pontos constantes nos objetivos gerais;
d)Conhecer práticas agroecológicas para aprendizado mútuo em todo o Brasil de bicicleta;
e)Trazer as experiências para serem partilhadas em nosso meio, nos sertões nordestinos.

Um pouco sobre o grupo

Somos um grupo que está nas realidades urbanas e rurais com opção clara pela causa sócio-eclógica, com presença mais constante nas realidades rurais e, mais especificamente, nas áreas de reforma agrária (Assentamento 24 de Abril e Assentamento Mandu Ladino/ Barra do Leme – Pentecoste). Estamos há mais tempo no Estado do Ceará, nordeste do Brasil. Acompanhamos as lutas sociais do campo e as ocupações de terra até formarem-se assentamentos legalizados. É daí que parte a nossa preocupação e para reafirmá-la sempre, resolvemos perambular com ela, partilhando-a com o mundo e seu universo de diversidade.

A primeira preocupação é o fato de termos mudado a terra de dono e não termos mudado as relações de produção, mantendo a mesma lógica produtivista com queimadas, agrotóxicos, herbicidas, etc (sem uma discussão política de produção e apropriação, permanecendo o trabalho alienado e com fins comerciais), e sem uma discussão sobre como devemos nos comportar frente ao esgotamento dos recursos naturais, inclusive da terra.

A segunda preocupação é com o desaparecimento das sementes originais, as quais nós plantávamos, colhíamos e da nossa colheita plantaríamos novamente. A maioria das sementes passou por um processo de hibridação que nos fez perder o controle das nossas lavouras, pois temos que comprar todas as vezes que quisermos plantar as hortaliças, principalmente.

A liberação dos transgênicos nos foi a gota d’água, a qual nos fez decidir arribar mundo afora para travar debates sobre esta realidade. Ao voltarmos para nossa terra, queremos trazer dados concretos sobre as questões levantadas.

2 comentários:

Anônimo disse...

achei a idéia e o projeto muito boa, espero que continuem e não desistam diante das dificuldades...

Unknown disse...

Sou professora do curso de arquitetura da Unifor e mestranda em Psicologia. Estou estudando o uso da bicicleta como transporte alternativo à mobilidade. Agradeço contribuições sobre o assunto. renata.rola@bol.com.br